“Os benefícios dos contos de fadas aos ouvidos e alma dos pequenos”. Roda de conversa com o médico Darlan Schottz.

Resumo livre de Fernanda Sansão Hallack | Psicóloga, mãe de dois filhos na Escola Waldorf Michaelis.

O Dr. Darlan Schottz, médico clínico e escolar especializado em medicina antroposófica e pedagogia Waldorf, tratou, em palestra no dia 28/11/2019, na Escola Waldorf Michaelis, dos chamados “contos de fadas” como gênero literário, expressão artística e instrumento pedagógico que assaz alimenta a faixa etária que vai dos cinco aos oito anos, aproximadamente. São histórias ancestrais que fazem parte de toda e qualquer tradição oral, seja ela indígena, africana ou europeia, por exemplo, prenhes de arquétipos estruturais que suprem a gana de imaginação das crianças, estimulam sua formação de imagens e seu pensar imaginativo. Eles não visam suscitar a moral da história e o raciocínio lógico, mas a dramatização de situações comuns de homens simples na natureza, que vivem a expectativa, a indefinição, o sofrimento e a superação. Quanto mais é contado, mais o conto desperta a possibilidade de ressignificação e a potência imaginativa da criança, engendrando sua liberdade interna, sua autonomia e sua capacidade de manter a esperança.

O ensino na pedagogia Waldorf baseia-se, justamente, na premissa de que a educação baseada na audição treina a capacidade de concentração ao ancorar o eixo narrativo no centro da criança. Especialmente no 2º setênio, tudo é contado e não explicado. Da mesma forma que o leite materno é vital para a estrutura física, a narrativa oral é vital para a consciência imaginativa e o centramento.

Sobre as críticas recorrentes acerca dos conteúdos dos contos de fadas, por vezes deveras inverossímeis, inclementes ou atravessados por ideologias, Darlan analisa que a criança os decompõe e absorve seus elementos identificatórios universais e arquetípicos com sua simplicidade – e não com a complexidade e o julgamento do mundo adulto.

“Muito se discute sobre o valor dos contos de fadas. Afirma-se que estes alienam a criança da “realidade” e, devido a certos trechos cruéis, frequentemente constituem um alimento de valor duvidoso. Aqui também devemos entender-nos melhor! Em primeiro lugar, os bons contos são aqueles que têm sua origem na vetusta sabedoria popular, como os recolhidos pelos irmãos Grimm. Contos “compostos” intelectualmente não têm o mesmo valor. Por quê? Os verdadeiros contos de fadas contêm em suas imagens fatos e processos autênticos da evolução espiritual do homem. A criança extrai dos contos profundas verdades, embora numa forma primitiva mas, justamente por isso, adequada aos primeiros anos de vida. Um conto nunca deve ser lido, mas narrado, e além disso repetido em dias seguidos. A pessoa que conta deve saber que as imagens transmitidas correspondem a uma profunda sabedoria popular; outrossim, deve falar como se acreditasse inteiramente em tudo o que está narrando. Os trechos mais cruéis não devem ser postos em relevo nem contados com abundância de detalhes sangrentos e requintes de sadismo; assim eles desempenharão a função de constituir o momento de maior tensão a partir do qual tudo corre para o desenlace feliz, a recompensa do justo, a punição do mau – cenas que nunca faltam. Os contos, com efeito, têm seu ritmo e sua dinâmica intrínsecos, que lhes confere alto valor educativo.”

Rudolf Lanz. “Noções Básicas de Antroposofia”. Editora Antroposófica.

“O julgamento moral não deve ser inoculado na criança. Deve-se prepará-lo de tal modo que, quando a criança, com a maturidade sexual, desperta para a força completa do julgamento, consegue, pela observação da vida, formar por si própria o julgamento moral. A pior forma de atingi-lo é transmitir à criança uma ordem pronta. Atinge-se, no entanto, quando se atua por meio de um exemplo ou colocam-se exemplos diante dela. Deve-se dar à criança imagens para o bem por meio de narrativas de pessoas que foram ou são boas, ou por elaboração de pessoas boas adequada à fantasia. […] Não se apela ao intelecto, mas à simpatia para com o bem e à antipatia para com o mal que, sob forma de imagem surgem diante da alma da criança. Assim a alma é preparada de tal maneira que, posteriormente, o julgamento pelo sentimento possa amadurecer na idade correta como julgamento intelectual. Não se trata de transmitir o “você deve”, porém de despertar um julgamento estético na criança, de modo que o bem lhe agrade, tenha simpatia para com ele, e tenha desagrado, antipatia, para com o mal, quando seu sentir é defrontado com fatos morais”.

Rudolf Steiner. Fonte: GA 305, Trad. VWS; rev. SALS. (http://www.sab.org.br/steiner/afor-todos.htm)