O Terceiro ano, as profissões e a construção de um violino

C U R R Í C U L O  W A L D O R F

Faz parte do currículo do terceiro ano de uma escola Waldorf a Época das profissões.

Após estudarem a  chegada do ser humano na terra, as crianças estudam como se foi adquirindo habilidades e ofícios necessários para a vida, desde as profissões primordiais até os dias de hoje. Elas as pesquisaram, contemplaram, desenharam, escreveram sobre as mesmas e, a cada semana, receberam em sala de aula os pais da turma para falar de suas ocupações e trajetórias profissionais.

É no terceiro ano também, na aula de música, que as crianças são introduzidas aos instrumentos de corda: violino, violoncelo, viola...

Pensando em correlacionar estes dois momentos de aprendizagem, a professora de música Marília Felicíssimo e a professora de classe do terceiro ano Thassia Oliveira desenvolveram uma atividade interdisciplinar: foram visitar a oficina de um luthier, André Spada, especialista em construção artesanal de instrumentos de corda.

Nesta visita, as crianças tiveram a oportunidade de ver como os instrumentos são construídos e conhecer as ferramentas utilizadas para a criação dos mesmos.

Para a experiência se fazer completa, outro luthier foi convidado para vir à escola e construir um instrumento com as crianças.

Federico Klurfan, luthier e músico, desenvolve um trabalho social com jovens e adultos em Cachoeiras de Macacu. Sem possibilidades para adquirirem os instrumentos industrializados, Federico constrói, com eles, violinos, pífanos e outros cordófonos com materiais sustentáveis como o bambu. Ele mesmo nos relata como foi a vivência com as crianças na Michaelis:

“Meu nome é Federico e faço parte de um coletivo artístico de luthieria sustentável, música e oficinas que se chama Camarada Matagal @camaradamatagal.

Fui convidado para dar uma oficina para crianças de 9 anos no Jardim-Escola Michaelis do Rio de Janeiro, onde confeccionamos com os alunos um violino de bambu. 

Esse instrumento foi inspirado em um violino indígena da região da Chiquitania boliviana. Nesta área, há 500 anos, os jesuítas montaram suas missões e ensinaram os indígenas das etnias Guaraní e Guarayos a tocarem o antigo violino barroco, também chamado de Rabeca (lembrando que não existia o violino moderno, como conhecemos hoje)Aparentemente os nativos se apaixonaram pelo som, mas como os jesuítas não os deixaram levar os instrumentos para as aldeias, eles passaram a construir os seus próprios instrumentos. Foi então que eles criaram o primeiro violino taquara (bambu nativo) sulamericano. 

Conheci alguns desses antigos instrumentos através da pesquisa de um músico e luthier argentino Ricardo Massur e passei a construir os meus próprios violinos, mais voltados para o ajuste e afinação do violino moderno. Meu objetivo era simplesmente a educação musical em comunidades isoladas ou carentes.

O material utilizado para a confecção do violino foi: bambu, madeiras recicladas, crina de cavalo, cordas de violino, fio de latão ou de eletricidade de 6mm.

Na oficina realizada na Michaelis, confeccionamos o corpo do instrumento, as cravelhas, o estandarte, a pestana, o rabicho e o arco. O violino de bambu finalizado será utilizado nas aulas de música e servirá de modelo para outros instrumentos a serem por eles criados.

O mais importante é que eles começaram a usar as ferramentas básicas de luthieria com segurança e trabalharam de diversas maneiras com a madeira e o bambu.”

Federico trouxe também um outro violino, feito por ele, e a escola o adquiriu com a renda arrecadada pela turma com as vendas de pães ao longo do ano.

Ambos os instrumentos ficarão para uso da escola e todos poderão tocá-los.

Foi uma experiência muito enriquecedora para os alunos visitar um luthier, ver os instrumentos que eles praticaram durante o ano todo, e depois construírem este instrumento com as próprias mãos. Mergulharam no fazer específico do trabalho e nas ferramentas necessárias para realizá-lo. 

Tiveram, com isto, a oportunidade de olhar mais atentamente para as possibilidades de atuação positiva no mundo, de maneira integral e saudável, mostrando que se pode transformar algo através de suas próprias  habilidades. Com certeza, esta vivência ficará guardada na memória e no espaço afetivo de todas as crianças.